Tomo a liberdade de ser mal educado,
De adiantar-me num livro
Abrir a boca e soltar um grito
Sem pontuação.
Ignoro a dúvida
Dando-me ao silêncio.
Questionar dá-me dores de cabeça.
Podia entregar minha vida ao tempo
Mas já dele fiz parte.
Aprendi muito na minha ignorância,
Na passagem inglória da carne p'la terra,
Na ausência da minha presença;
Ser apenas - respirar, fazer assim parte.
Escrevo a minha realidade.
Não conheço o que é ficção
Faço crasso meu adentro
Por um monte de palavras.
Um punhado de memórias,
Escrituras de coisas mortas.
Segura-me o passado
Vindo da boca da saudade
Tamanha amargura.
--- Boca de lábios tenros
E encarnados,
Com neles ainda vida.
Tragam o beijo sem pudor!
Permitem-me o toque na sua carne
Deixai meus dedos escrevinhar
Pelo que o peito acelera,
Dai-me liberdade para amar.
Digam-me que são d'agora,
Se querem meu nome
Digam-no sem vergonha
Mostrem-me, num encosto,
(...)
Sou sem destino,
Ambulância sem rumo
De sirenes ligada.
Vou de urgência ao encontro
De qualquer coisa pintada
Não fosse minha alma
Ansiosa p'la arte.
Busco o íntimo
O profundo e a cumplicidade,
Sexo sem arreios
Qual facas de saudades.
Tropeço, no entanto, na entrega
Quando me rouba a palavra
O ato, quando se distancia o peito
Por o que digo maldade;
Esta frieza de meus dedos
Que escrevem à paulada
A sua mácula.
Estou cansado e não paro,
(...)
Quero sair da boca do povo
Quero chegar onde não fui
Abraçar este silêncio profundo,
Que alguém chegue e faça barulho.
Serei tudo quanto penso
Força inerte do pensamento,
De meus membros a força somente
De escrever o que tenho dentro.
E em espírito, se a tal chegar,
Minha alma alimentada d'este ar,
Morrerei todos os dias
Antes d'alguém me salvar.
Faço espera no leito d'este limbo
Com receio nele tropeçar
Pois nasci para ser sozinho,
Desde pequeno (...)
Então serei,
Desligado da saudade
Em quebranto,
Longe da sensação
D'agora!
Não ouvem meu silêncio,
Como podem...
Existo para o exterior sem vida
E julgam que morri.
Vivo a maior das ambições
Em que tudo por dentro me completa.
O meu íntimo é profundo
Minha língua quem lhe dera.
Não ouvem meu silêncio,
Como podem...
Demasiado tempo deixei passar
Só para descobrir o que era o tempo.
Hoje tenho-o nas mãos
E deixo-o passar, como é,
Po (...)
Fui na escrita crescido
Homem com pudor
De jovem menino,
Sonhador sagaz
Expoente de meu íntimo
Em tudo que minha mente aconteceu.
Cruzei a existência
Que a mim compete,
Rabisquei nela
O que a cabeça escreve,
Vivi para além de mim
Uma outra vida,
Não soube quem me era.
Tudo que amei
Amei sozinho,
Fui além da compreensão.
Senti tudo como bom menino,
Tanto a dúvida como a razão.
Criei uma voz que me agoira
E toda a vez me dá a mão,
(...)
Não reconheço as palavras deste papel Minha alma fala agora, Sozinha sem mim.
Encontrei na solidão o conflito Entre a existência e o seu significado. Abracei o desconhecido E a ele fiquei agarrado Meu propósito perdeu-se E eu, no mundo abandonado, Também de tudo me libertei.
Virei a atenção para o subterrâneo, O morto na história E a vida cantada pela boca da sua laje, Oh! Como foi que morri! Abracei esqueletos e caveiras Canções de tempos antes da nascença Murmurei, (...)
Escrevo,
Desenfreadamente
Sem escrúpulos,
Sem nexo,
Somente o que meu peito sente
E esse encolhe-se.
Amo-te!
Oh, que bastava,
Bastava sentir o que sinto
Para mostrar tal amor!
O que me falta?
Que neurótico minha cabeça me fez?
Espinhos! Terei minha mão cravada
Ou sou eu quem os ostenta;
Porque magoo tanto...
Vem de dentro tão belo
Porque é à superfície horripilante?
Dedicaria minha existência
A olhar para ti.
Entregaria meu corpo
Na (...)
Fui criança, um dia.
Não mais choro,
Não como criança perdida.
Encontrei o tempo, numa esquina,
Apertámos a mão e ficámos amigos.
Faz parte, e eu também,
Assim são as coisas da vida.
Ao vê-lo afastar-se, desapegar-se
E seguir, tornei-me melancólico.
Perdi madrugadas a pensar.
Deixei de dormir a pensar.
A vida passava e eu pensava,
O que há de ser de mim?
Tinha-te a meu lado, julgava,
E entreguei-to a ti.
Eram agora as minhas madrugadas (...)
Regai-me com a fome de querer mais
Pois se me forças o alimento à boca,
Eu morro.
Não me sacies!
Que meu estômago não conheça sua função,
Que minha língua não deguste
O pecado, que não me tentes,
Ó vida, com teu prazer,
Deixai-me, eu aprenderei a morrer.
E na ausência, na distância do passado,
Sorrirei.
Sorrirei por não precisar de nada.
Mostrarei meus dentes ao adverso
E à conquista, serei rio e pedra,
Farei-me neste agora,
No peixe que nada no rio (...)