Sinto-me caminhar ao lado do mundo, e não nele.Os rios que correm, vejo-lhes eu o fundo, a sua eterna queda num abismo de nada:Cascatas infindas de desgostos e vidas.Ah, fosse eu sentir as águas!
Os ventos e as árvores desprezam-meNas suas danças celestes.Toda a vida acolhem e abraçamE eu nos seus tornados ou espinhos me embaraço.Não me quer a terra!
Aos céus praguejo, e os corvos oiço.- Levem-me daqui! Grito eu.E um chilrear negro ecoa, como resposta.Amedrontam-se as (...)
Faleci nos teus braços
Assim como quem se afoga no mar.
Sucumbindo levemente à vida
Até ao instante em que esta me decidiu levar.
Não lutei nem desesperei, mas ali fiquei
Caído no teu colo, num abraço (para mim) eterno.
Pudesse eu, reencarnado, não sei,
Repetir esse abraço, desta vez sentindo-o com afago
E não com esta frieza agora dos meus braços.
Fui eu mesmo que me matei.
E foi no teu colo onde moribundo me esvaí
Com o sangue que te manchou o vestido.
O amor, esse (...)
Vivo um dia inteiro pensando na vida do próximo dia,
Em como abordarei alguém na rua, oferecendo um aceno de cumprimento ou um braço estendido.
Que direção tomar para alcançar o mesmo local, aquela rua refundida ou entre a algazarra matinal das pessoas pelos cafés, cheios de sorrisos e vozes altas.
Pouco realmente muda o dia, mas penso sempre que mudo eu, de algum jeito...
Mas sou sempre eu.
Seguro em livros que não leio, imaginando que leria se não fosse eu.
Escrevo palavras (...)
(Só existe um silêncio capaz de perturbar a continuidade de uma onda de som...)
Calem-se os barulhentos,
Cessem os circos, os palcos e os espetáculos,
Acabem com a raça daqueles que se dizem nascer iluminados
Pois esses de nada sabem!
E escutem... Oiçam... Mas não a mim; isso! Esse mesmo...
Esse silêncio que a leitura provoca, pois a voz que se ouve ao ler é a nossa!
Não há andorinhas no mar
Assim como não há peixes nos beirais dos telhados.
A Natureza dentro de si (...)
Corram.
Fujam das palavras como quem evade-se do tempo, e sejam mais que tempo nas palavras.
Germinem-se gente por dentro e evitem às palavras atribuir sentimentos:
Somos mais que isso; o nosso peito assim o sente.
Quantos manuscritos não estão perdidos, quantas cartas não estarão rasgadas,
O quê senão puro amor de um canto escuro viu-se libertado?
O constante equívoco entre sentimentos e pensamentos origina a prisão da mente
Não reconhecendo mais essa a criação da (...)
(...) «A medicina, as comunicações eletrónicas, as viagens espaciais, a manipulação genética... são estes os milagres que hoje contamos aos nossos filhos. São estes os milagres que apresentamos como prova de que a ciência nos trará respostas. As antigas histórias de imaculadas conceições, de sarças ardentes e de mares a abrirem-se deixaram de ser relevantes. Deus tornou-se obsoleto. A ciência venceu a batalha. (...)
«Mas a vitória da ciência costou-nos a todos. E (...)
Escrevo em papel envelhecido pelo tempo
Aquilo que mais vivo sinto, por dentro.
Contradigo o sentimento, fazendo-o de pensamento.
Prolongo e antecipo a vida, mas tudo isso apenas na mente.
Esguio, entranho-me dentro da ampulheta que rege a vida e o momento
E assim caio, eternamente, em todas as situações e acontecimentos empurrados pelas areias do tempo.
Penso muito no passado, no que poderia ter feito.
Mas aquilo que não disse ontem é o que penso ao escrever hoje, que não (...)
Faço-me de palavras, perdendo-as assim que proferidas;Não sou nada.
Eterna queda, como a da chuva que não cessa, Sou mais uma gotícula que se perdeu dos céusE que caiu na terra;Não sou nada
Transbordo e faço cheias, com os quantos eu's de que me vi separadoObservando-me cair por inteiro, aos bocados... Na terra ficando manchado.Parte de mim acompanha pequenos riachos, outra encontra simples poças.Encharco quintais, prados, atiro-me dos céus negros ao encontro do azul do (...)
Nasce, entre as montanhas tão altas como os céus,
Os sonhos de crianças.
Nos seus olhares encontra-se a beleza da juventude,
Um brilho que ofusca o pensamento, nele apenas se sente.
Num céu soturno, são eles que dos sonhos criam as suas estrelas
Viajando entre elas, qual transporte celestial.
Com o tempo, o brilho vai-se perdendo.
Os pensamentos turvam-se com os sentimentos e fazemos aquilo que nunca deveríamos ter feito:
Questionar o que sentimos.
Os cumes das montanhas (...)
Furtivas na sua elegância
As palavras escorrem no papel
Como tinta numa tela.
Para surgirem basta-lhes o incentivo,
As restantes apoderam-se da brecha que provocámos
Entre a sensação e a expressão:
Um mar de tinta se revela, onde a vida marítima são emoções.
No fundo desse vasto oceano encontram-se borras de tinta
Que rabiscámos um dia.
Todas elas memórias passadas,
Muitas delas sensações sofridas.
Aprendemos com o tempo que o fundo não se enterra mais;
Não aumenta (...)